terça-feira, 25 de outubro de 2011

Nunca desista

“Nunca desista , não importa o que aconteça.
Nunca desista, desenvolva seu Coração.
Muita energia no seu país (lugar)
Está sendo gasta para desenvolver a razão ao invés do Coração
Seja compassivo
Não só para seus amigos, mas para todos
Seja compassivo
Trabalhe pela paz no seu coração e no mundo.
Trabalhe pela paz e digo novamente – nunca desista.
Não importa o que esteja acontecendo,
Não importa o que apareça a sua volta,
Nunca desista.”
SS IV Dalai Lama


Os versos acima são tradução do anexo enviado por Doju, monja budista da tradição Soto Zen que mora na Itália e que recentemente compartilhou suas experiências conosco aqui em Santos.

Os versos pertencem a SS IV Dalai Lama, Yontem Gyatso, que viveu por volta de 1590 e bisneto de Althan Khan ( da família de Gengis Khan) , único Dalai Lama nascido fora do Tibet, na Mongólia, entre varias disputas de povos e seitas.
Um de seus Mestres foi I Panchen Lama, grande erudito de seu tempo.
Faleceu ainda jovem aos 25 anos.

Os séculos passam e as guerras continuam; guerras externas e internas.

Na verdade, aprender a desistir faz parte da sabedoria.

Desistir das fixações, das manias, das crenças pessoais, das tentativas de controlar a vida, da necessidade de tornar tudo
seguro e garantido, de agradar, de parecer jovem , de encontrar o romance ideal, de querer justiça a qualquer preço......
bem....a lista vai longe.

Na verdade a sabedoria chega quando decidimos desistir de sofrer.
Todo sofrimento tem um apego do qual não queremos desistir.

Mas, como diz, esse Dalai Lama na sua juventude genial, desistir de tudo mas
nunca desistir de manter o coração compassivo.

Coração compassivo,afasta bondosamente o drama, evita julgar mas mantém a lucidez – o fato como ele é, sem adjetivos.

E lembre-se:

Quando as coisas ficarem muito difíceis, pare, abrace seu coração compassivo, relaxe e pense se não é hora de desistir e encontrar outro caminho.

terça-feira, 18 de outubro de 2011

Sincronicidades da bondade amorosa

Na semana que passou durante os encontros de estudos, um dos temas foi “ o que é amar”.
Qual a tua definição para amar?

Para facilitar pense em quem você não se cansa de amar, mesmo com as contrariedades que acompanham todas as relações. Só não vale colocar filhos e netos porque nessas relações a produção do hormônio oxitocina, resultado desses vínculos profundos pode mascarar a definição.

Pensou o que é amar?

Então...

No Tibet no lugar do verbo amar, é usada a expressão bondade amorosa.
Cultivar a bondade amorosa por todos os seres, sem preconceitos, parece mais viável.

Na bondade amorosa o foco está no bem-estar do outro, seja um humano, um animal ou um Buda – mesmo que isso contrarie o nosso ponto-de-vista.

A bondade amorosa é recheada pelas 4 generosidades:

Dar apoio material
Dar proteção
Ensinar o que sabe
Aceitar sem condições

Bem, concordemos, uma super tarefa; mas vale ter esse modelo como objetivo para corrigir as loucuras do amor ignorante a que estamos condicionados.
Amor ignorante é aquele que super protege, compensa com excessos materiais e comestíveis, minimiza a auto-responsabilidade, mascara os enganos, negligencia os limites dos outros e paga para tirar o problema da frente – é um amor egoísta; a bondade amorosa é altruísta e prevê fundamentalmente a responsabilidade dos atos.

Sincronicamente recebi da Bodisatva o importante texto abaixo e compartilho com você; se puder compartilhe essas sabias palavras com seus conhecidos.

A pratica de Methabavana pessoalmente dissolve raivas e outras sensações “estranhas” ao mesmo tempo que reflete um fluxo de bondade e lucidez na direção da pessoa a quem dedicamos a pratica.
Experimente confiantemente com teus Mestres de treinamento, aqueles “pequenos tiranos” com quem você convive e observe os resultados interessantes surgirem.


Bodisatva | Transformação de Dentro para Fora



________________________________________
Transformação de Dentro para Fora

Muitas vezes dizemos que seres humanos são “bichos de relação”. Temos a vida norteada e sustentada por relações de todos os tipos: afetivas, profissionais, familiares, espirituais. Relações do passado, presente e futuro parecem construir nossas histórias. Muitas vezes nos sentimos marcados e até nos definimos a partir das relações. Conversamos sobre elas nas rodas de amigos, consultórios, escolas, no trabalho, na folia… Segredos, momentos de alegria e êxtase, noites insones… Ah, as relações… Como tranformá-las?
Olhando de modo mais honesto, a maioria delas talvez tenha um tom utilitário. Oferecemos uma lista de necessidades a alguém, que nos oferece lista semelhante e negociamos. “Ok, amo você, aceito fazer o que me pede, caso você cumpra isso e mais aquilo…” E seguimos, entre pequenas alegrias e grandes frustrações. Parece um jeito pouco hábil de ser feliz.
S.S. Dalai Lama nos lembra que todos aspiramos encontrar a felicidade e ultrapassar o sofrimento. Será que podemos amar de modo mais profundo, tecer relações mais saudáveis, afinadas com nossas aspirações de felicidade?
Uma das práticas mais comoventes que o budismo nos oferece é Metabhavana – Meditação do Amor Universal. Tal prática tem se mostrado uma preciosa ferramenta que opera em nossos corações e mentes, gerando espaços por vezes inusitados.
A partir dessa prática geramos mundos nos quais as relações saudáveis e lúcidas são possíveis. A partir de ambientes sutis, descobrimos novos caminhos, novos modos de tecer as relações. Focamos cada pessoa, incluindo a nós mesmos, as árvores, os bichos… “Que meu filho seja feliz e ultrapasse o sofrimento. Que encontre as causas da felicidade e ultrapasse as causas do sofrimento. Que seus automatismos se dissolvam e surja nele um olho de lucidez instantânea diante de tudo e de todos. Que ele seja capaz de gerar benefícios aos outros e encontre nisso sua fonte de energia”.
“Que meu filho seja feliz”. Parece incrível, mas raramente temos essa visão. Sentimos que amamos muito nosso filho, mas geralmente aspiramos que ele “se dê bem na vida”, que nos respeite, ou algo semelhante. De modo aparentemente “natural”, surgem em nossa mente algumas – ou muitas – condições que consideramos necessárias para seu bem-estar, vitórias, conquistas, etc. E se tais condições não se manifestam, a relação desanda, a comunicação fica comprometida e a lucidez nos falta. Olhar para o próprio filho a partir de outros referenciais pode transformar por completo uma rede de relações ligadas ao passado, presente e futuro. Descobrimos que nossas necessidades de controle, e todas as negociações e estratégias de controle podem cessar. A vida fica mais simples. As relações saudáveis vão surgindo aqui e ali, e um novo tecido humano se torna possível.
A prática de Metabavana, aparentemente simples, tem restaurado relações de modo surpreendente. Funciona. Não porque usamos palavras mágicas, mas porque nosso olhar constrói. Revela a co-emergência operando. Mas isso já é outra história. Melhor experimentar. E se preparar para amar de modo mais profundo. Que todos sejam felizes!

http://bodisatva.com.br/
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2. A meditação e seus pequenos milagres
3. Conselho precioso de Alan Wallace

quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Para resolver a equação, filhos=preocupação

Para pais aflitos e filhos insatisfeitos.....

Na semana passada, durante um programa de TV ouvi a brincadeira:
“ se você morresse e encontrasse com Deus o que você falaria?
_eu diria: Você tem muitas coisas para me explicar...”

Uma dessas coisas é como resolver satisfatoriamente a preocupação com os filhos.
Resolver, ou melhor, transformar positivamente essa sensação de incapacidade frente a tantos desafios e duvidas.

Joan Manuel Serrat na sua música “ Esos locos bajitos” canta algumas dessas sensações:

Nos empenhamos a dirigir suas vidas sem saber a função e sem vocação.
Vamos transmitindo-lhes nossas frustrações através das canções.
(repetimos): para de jogar bola, isso não se fala, isso não se faz, isso não se toca.
Nada nem ninguém pode impedir que sofram,
Que os ponteiros avancem no relógio,
Que decidamos por eles,
Que se enganem,
Que cresçam e que um dia
Nos digam adeus.

Nos preocupamos por quem não acreditamos competentes.

Sentimos os filhos como extensão da nossa vida e, por isso, nos sentimos responsáveis por suas escolhas.
Até onde entendi, ser mãe, ser pai é apoiar as experiências que os filhos escolhem ou que a vida lhes presenteia.
Tentar não ter expectativas, evitar lutar contra suas certezas,projetar nossos sonhos, medos, sustos e sustentar suas dores ......é uma tarefa bastante dificil.

Mesmo porque , ao mesmo tempo que tentamos fazer isso, o filme da nossa vida continua rolando com os sustos da nova velha idade, os novos medos, os sonhos despedidos e expectativas frustradas.

Mesmo com todo esse trabalho, os momentos de realização e superação nos dão esperança acendem a admiração por nossos
“locos bajitos”.

Tudo isso para concluir com a frase de um Mestre Indiano que li no encontro com SS Dalai Lama, mas que infelizmente não lembro o nome:

“não se preocupem com seus filhos, rezem por eles!”

Para resolver a equação, filhos=preocupação

Para pais aflitos e filhos insatisfeitos.....

Na semana passada, durante um programa de TV ouvi a brincadeira:
“ se você morresse e encontrasse com Deus o que você falaria?
_eu diria: Você tem muitas coisas para me explicar...”

Uma dessas coisas é como resolver satisfatoriamente a preocupação com os filhos.
Resolver, ou melhor, transformar positivamente essa sensação de incapacidade frente a tantos desafios e duvidas.

Joan Manuel Serrat na sua música “ Esos locos bajitos” canta algumas dessas sensações:

Nos empenhamos a dirigir suas vidas sem saber a função e sem vocação.
Vamos transmitindo-lhes nossas frustrações através das canções.
(repetimos): para de jogar bola, isso não se fala, isso não se faz, isso não se toca.
Nada nem ninguém pode impedir que sofram,
Que os ponteiros avancem no relógio,
Que decidamos por eles,
Que se enganem,
Que cresçam e que um dia
Nos digam adeus.

Nos preocupamos por quem não acreditamos competentes.

Sentimos os filhos como extensão da nossa vida e, por isso, nos sentimos responsáveis por suas escolhas.
Até onde entendi, ser mãe, ser pai é apoiar as experiências que os filhos escolhem ou que a vida lhes presenteia.
Tentar não ter expectativas, evitar lutar contra suas certezas,projetar nossos sonhos, medos, sustos e sustentar suas dores ......é uma tarefa bastante dificil.

Mesmo porque , ao mesmo tempo que tentamos fazer isso, o filme da nossa vida continua rolando com os sustos da nova velha idade, os novos medos, os sonhos despedidos e expectativas frustradas.

Mesmo com todo esse trabalho, os momentos de realização e superação nos dão esperança acendem a admiração por nossos
“locos bajitos”.

Tudo isso para concluir com a frase de um Mestre Indiano que li no encontro com SS Dalai Lama, mas que infelizmente não lembro o nome:

“não se preocupem com seus filhos, rezem por eles!”

sexta-feira, 7 de outubro de 2011

Steve Jobs, a gente se vê na Terra Pura!

Nestas últimas noticias desconfiei que ele se inspirava na propostas budistas.
Mas não!!! Ele foi budista e desde muito cedo; até ensaiou ser um monge zen-budista.

Como deve ser reconfortante ir embora embalado pela gratidão de milhões de pessoas!
Gratidão pelo trabalho realizado, pelas frases ditas, pelos pensamentos renovadores, pelas grandes idéias, pelo bom combate !!!

Gratidão pelas ações de corpo, palavra e mente de alguém, pelo menos aparentemente, desprovido da vaidade da celebridade.
Gratidão pelo que S. Jobs facilitou para nos sentirmos interdependentes; ele é um dos personagens do “fenômeno internet” – o aprendizado da vacuidade na pele, nos dedos, nas telas e nos ícones – nas respostas rápidas, na comunicação urgente.
E, palmas, muitas palmas, um personagem que jogou limpo!!!!

S. Jobs foi um dos loucos geniais da nossa era.
Seus rastros serão vistos e sentidos durante bastante tempo.


Ficam pra nós alguns recados que ele deixou para pensar, meditar e usar já que somos responsáveis pela nossa vida.

Num anúncio que vai mostrando imagens de Luter King, Gandhi, Eistein, Callas, Lenon, Picasso, Hitchcock entre outros termina com “pense diferente” enquanto a voz quente de Steve Jobs recita:

Aqui estão alguns loucos. Os deslocados. Os rebeldes. Os criadores de problema. Aqueles que enxergam as coisas de forma diferente. Eles não são reféns das regras. E eles não têm respeito pelo status quo. Você pode citar, discordar, glorificar ou desqualifica-los. A única coisa que não dá para fazer é ignora-los. Porque eles mudam as coisas. Eles empurram a raça humana pra frente. Enquanto alguns os percebem como loucos, nós os vemos como gênios. Porque as pessoas que são loucas o suficiente para pensar que podem mudar o mundo, são aquelas que realmente mudam.

Se quiser você pode ver esse anúncio (que nunca foi veiculado) no blog do Marcelo Tas.

Aproveito este nosso encontro virtual para compartilhar ( para quem ainda não teve a oportunidade de ler) o discurso tocante de S. Jobs como paraninfo intitulado– enviado gentilmente pela Alessandra:

Você tem que encontrar o que você ama.

“Você tem que encontrar o que você ama. Estou honrado de estar aqui, na formatura
de uma das melhores universidades do mundo. Eu nunca me formei na universidade.
Que a verdade seja dita, isso é o mais perto que eu já cheguei de uma cerimônia de
formatura. Hoje, eu gostaria de contar a vocês três histórias da minha vida. E é isso.
Nada demais. Apenas três histórias.
A primeira história é sobre ligar os pontos.
Eu abandonei o Reed College depois de seis meses, mas fiquei enrolando por mais 18
meses antes de realmente abandonar a escola. E por que eu a abandonei? Tudo
começou antes de eu nascer. Minha mãe biológica era uma jovem universitária solteira
que decidiu me dar para a adoção. Ela queria muito que eu fosse adotado por pessoas
com curso superior. Tudo estava armado para que eu fosse adotado no nascimento
por um advogado e sua esposa. Mas, quando eu apareci, eles decidiram que queriam
mesmo uma menina.
Então meus pais, que estavam em uma lista de espera, receberam uma ligação no
meio da noite com uma pergunta: “Apareceu um garoto. Vocês o querem?” Eles
disseram: “É claro.”
Minha mãe biológica descobriu mais tarde que a minha mãe nunca tinha se formado
na faculdade e que o meu pai nunca tinha completado o ensino médio. Ela se recusou
a assinar os papéis da adoção. Ela só aceitou meses mais tarde quando os meus pais
prometeram que algum dia eu iria para a faculdade. E, 17 anos mais tarde, eu fui para
a faculdade. Mas, inocentemente escolhi uma faculdade que era quase tão cara quanto
Stanford. E todas as economias dos meus pais, que eram da classe trabalhadora,
estavam sendo usados para pagar as mensalidades. Depois de seis meses, eu não
podia ver valor naquilo.
Eu não tinha idéia do que queria fazer na minha vida e menos idéia ainda de como a
universidade poderia me ajudar naquela escolha. E lá estava eu, gastando todo o
dinheiro que meus pais tinham juntado durante toda a vida. E então decidi largar e
acreditar que tudo ficaria ok.
Foi muito assustador naquela época, mas olhando para trás foi uma das melhores
decisões que já fiz. No minuto em que larguei, eu pude parar de assistir às matérias
obrigatórias que não me interessavam e comecei a frequentar aquelas que pareciam
interessantes. Não foi tudo assim romântico. Eu não tinha um quarto no dormitório e
por isso eu dormia no chão do quarto de amigos. Eu recolhia garrafas de Coca-Cola
para ganhar 5 centavos, com os quais eu comprava comida. Eu andava 11 quilômetros
pela cidade todo domingo à noite para ter uma boa refeição no templo hare-krishna.
Eu amava aquilo.
Muito do que descobri naquela época, guiado pela minha curiosidade e intuição,
mostrou-se mais tarde ser de uma importância sem preço. Vou dar um exemplo: o
Reed College oferecia naquela época a melhor formação de caligrafia do país. Em todo
o campus, cada poster e cada etiqueta de gaveta eram escritas com uma bela letra de
mão. Como eu tinha largado o curso e não precisava frequentar as aulas normais,
decidi assistir as aulas de caligrafia. Aprendi sobre fontes com serifa e sem serifa,
sobre variar a quantidade de espaço entre diferentes combinações de letras, sobre o
que torna uma tipografia boa. Aquilo era bonito, histórico e artisticamente sutil de uma
maneira que a ciência não pode entender. E eu achei aquilo tudo fascinante.
Nada daquilo tinha qualquer aplicação prática para a minha vida. Mas 10 anos mais
tarde, quando estávamos criando o primeiro computador Macintosh, tudo voltou. E nós
colocamos tudo aquilo no Mac. Foi o primeiro computador com tipografia bonita. Se eu
nunca tivesse deixado aquele curso na faculdade, o Mac nunca teria tido as fontes
múltiplas ou proporcionalmente espaçadas. E considerando que o Windows
simplesmente copiou o Mac, é bem provável que nenhum computador as tivesse.
Se eu nunca tivesse largado o curso, nunca teria frequentado essas aulas de caligrafia
e os computadores poderiam não ter a maravilhosa caligrafia que eles têm. É claro que
era impossível conectar esses fatos olhando para frente quando eu estava na
faculdade. Mas aquilo ficou muito, muito claro olhando para trás 10 anos depois.
De novo, você não consegue conectar os fatos olhando para frente. Você só os
conecta quando olha para trás. Então tem que acreditar que, de alguma forma, eles
vão se conectar no futuro. Você tem que acreditar em alguma coisa – sua garra,
destino, vida, karma ou o que quer que seja. Essa maneira de encarar a vida nunca me
decepcionou e tem feito toda a diferença para mim.
Minha segunda história é sobre amor e perda.
Eu tive sorte porque descobri bem cedo o que queria fazer na minha vida. Woz e eu
começamos a Apple na garagem dos meus pais quando eu tinha 20 anos. Trabalhamos
duro e, em 10 anos, a Apple se transformou em uma empresa de 2 bilhões de dólares
e mais de 4 mil empregados. Um ano antes, tínhamos acabado de lançar nossa maior
criação — o Macintosh — e eu tinha 30 anos.
E aí fui demitido. Como é possível ser demitido da empresa que você criou? Bem,
quando a Apple cresceu, contratamos alguém para dirigir a companhia. No primeiro
ano, tudo deu certo, mas com o tempo nossas visões de futuro começaram a divergir.
Quando isso aconteceu, o conselho de diretores ficou do lado dele. O que tinha sido o
foco de toda a minha vida adulta tinha ido embora e isso foi devastador. Fiquei sem
saber o que fazer por alguns meses.
Senti que tinha decepcionado a geração anterior de empreendedores. Que tinha
deixado cair o bastão no momento em que ele estava sendo passado para mim. Eu
encontrei David Peckard e Bob Noyce e tentei me desculpar por ter estragado tudo
daquela maneira. Foi um fracasso público e eu até mesmo pensei em deixar o Vale [do
Silício].
Mas, lentamente, eu comecei a me dar conta de que eu ainda amava o que fazia. Foi
quando decidi começar de novo. Não enxerguei isso na época, mas ser demitido da
Apple foi a melhor coisa que podia ter acontecido para mim. O peso de ser bem
sucedido foi substituído pela leveza de ser de novo um iniciante, com menos certezas
sobre tudo. Isso me deu liberdade para começar um dos períodos mais criativos da
minha vida. Durante os cinco anos seguintes, criei uma companhia chamada NeXT,
outra companhia chamada Pixar e me apaixonei por uma mulher maravilhosa que se
tornou minha esposa.
A Pixar fez o primeiro filme animado por computador, Toy Story, e é o estúdio de
animação mais bem sucedido do mundo. Em uma inacreditável guinada de eventos, a
Apple comprou a NeXT, eu voltei para a empresa e a tecnologia que desenvolvemos
nela está no coração do atual renascimento da Apple.
E Lorene e eu temos uma família maravilhosa. Tenho certeza de que nada disso teria
acontecido se eu não tivesse sido demitido da Apple.
Foi um remédio horrível, mas eu entendo que o paciente precisava. Às vezes, a vida
bate com um tijolo na sua cabeça. Não perca a fé. Estou convencido de que a única
coisa que me permitiu seguir adiante foi o meu amor pelo que fazia. Você tem que
descobrir o que você ama. Isso é verdadeiro tanto para o seu trabalho quanto para
com as pessoas que você ama.
Seu trabalho vai preencher uma parte grande da sua vida, e a única maneira de ficar
realmente satisfeito é fazer o que você acredita ser um ótimo trabalho. E a única
maneira de fazer um excelente trabalho é amar o que você faz.
Se você ainda não encontrou o que é, continue procurando. Não sossegue. Assim
como todos os assuntos do coração, você saberá quando encontrar. E, como em
qualquer grande relacionamento, só fica melhor e melhor à medida que os anos
passam. Então continue procurando até você achar. Não sossegue.
Minha terceira história é sobre morte.
Quando eu tinha 17 anos, li uma frase que era algo assim: “Se você viver cada dia
como se fosse o último, um dia ele realmente será o último.” Aquilo me impressionou,
e desde então, nos últimos 33 anos, eu olho para mim mesmo no espelho toda manhã
e pergunto: “Se hoje fosse o meu último dia, eu gostaria de fazer o que farei hoje?” E
se a resposta é “não” por muitos dias seguidos, sei que preciso mudar alguma coisa.
Lembrar que estarei morto em breve é a ferramenta mais importante que já encontrei
para me ajudar a tomar grandes decisões. Porque quase tudo — expectativas
externas, orgulho, medo de passar vergonha ou falhar — caem diante da morte,
deixando apenas o que é apenas importante. Não há razão para não seguir o seu
coração.
Lembrar que você vai morrer é a melhor maneira que eu conheço para evitar a
armadilha de pensar que você tem algo a perder. Você já está nu. Não há razão para
não seguir seu coração.
Há um ano, eu fui diagnosticado com câncer. Era 7h30 da manhã e eu tinha uma
imagem que mostrava claramente um tumor no pâncreas. Eu nem sabia o que era um
pâncreas.
Os médicos me disseram que aquilo era certamente um tipo de câncer incurável, e que
eu não deveria esperar viver mais de três a seis semanas. Meu médico me aconselhou
a ir para casa e arrumar minhas coisas — que é o código dos médicos para “preparar
para morrer”. Significa tentar dizer às suas crianças em alguns meses tudo aquilo que
você pensou ter os próximos 10 anos para dizer. Significa dizer seu adeus.
Eu vivi com aquele diagnóstico o dia inteiro. Depois, à tarde, eu fiz uma biópsia, em
que eles enfiaram um endoscópio pela minha garganta abaixo, através do meu
estômago e pelos intestinos. Colocaram uma agulha no meu pâncreas e tiraram
algumas células do tumor. Eu estava sedado, mas minha mulher, que estava lá, contou
que quando os médicos viram as células em um microscópio, começaram a chorar. Era
uma forma muito rara de câncer pancreático que podia ser curada com cirurgia. Eu
operei e estou bem.
Isso foi o mais perto que eu estive de encarar a morte e eu espero que seja o mais
perto que vou ficar pelas próximas décadas. Tendo passado por isso, posso agora dizer
a vocês, com um pouco mais de certeza do que quando a morte era um conceito
apenas abstrato: ninguém quer morrer. Até mesmo as pessoas que querem ir para o
céu não querem morrer para chegar lá.
Ainda assim, a morte é o destino que todos nós compartilhamos. Ninguém nunca
conseguiu escapar. E assim é como deve ser, porque a morte é muito provavelmente a
principal invenção da vida. É o agente de mudança da vida. Ela limpa o velho para
abrir caminho para o novo. Nesse momento, o novo é você. Mas algum dia, não muito
distante, você gradualmente se tornará um velho e será varrido. Desculpa ser tão
dramático, mas isso é a verdade.
O seu tempo é limitado, então não o gaste vivendo a vida de um outro alguém.
Não fique preso pelos dogmas, que é viver com os resultados da vida de outras
pessoas.
Não deixe que o barulho da opinião dos outros cale a sua própria voz interior.
E o mais importante: tenha coragem de seguir o seu próprio coração e a sua intuição.
Eles de alguma maneira já sabem o que você realmente quer se tornar. Todo o resto é
secundário.
Quando eu era pequeno, uma das bíblias da minha geração era o Whole Earth Catalog.
Foi criado por um sujeito chamado Stewart Brand em Menlo Park, não muito longe
daqui. Ele o trouxe à vida com seu toque poético. Isso foi no final dos anos 60, antes
dos computadores e dos programas de paginação. Então tudo era feito com máquinas
de escrever, tesouras e câmeras Polaroid.
Era como o Google em forma de livro, 35 anos antes de o Google aparecer. Era
idealista e cheio de boas ferramentas e noções. Stewart e sua equipe publicaram
várias edições de Whole Earth Catalog e, quando ele já tinha cumprido sua missão,
eles lançaram uma edição final. Isso foi em meados de 70 e eu tinha a idade de vocês.
Na contracapa havia uma fotografia de uma estrada de interior ensolarada, daquele
tipo onde você poderia se achar pedindo carona se fosse aventureiro. Abaixo, estavam
as palavras:“Continue com fome, continue bobo.”
Foi a mensagem de despedida deles. Continue com fome. Continue bobo. E eu sempre
desejei isso para mim mesmo. E agora, quando vocês se formam e começam de novo,
eu desejo isso para vocês. Continuem com fome. Continuem bobos. Obrigado.”
Discurso de Steve Jobs na Universidade de Stanford em 2005.
Steve Jobs era zen-budista ele converteu-se ao Budismo quando era jovem e
chegou a pensar em se dedicar totalmente à filosofia, abrindo mão dos
negócios e vivendo como monge em um monastério do Japão. Para a
felicidade de todos nós, Jobs foi dissuadido da ideia e retornou aos Estados
Unidos.

Steve Jobs,
Tashidelê, Boa sorte !

terça-feira, 4 de outubro de 2011

Sobre o renascimento do próximo Dalai Lama

Declaração de SS o Dalai Lama

Posted: 03 Oct 2011 11:39 AM PDT

Logo após a visita ao Brasil, SS o Dalai Lama fez um pronunciamento sobre várias questões importantes. Falou sobre sua próxima encarnação e se a instituição “Dalai Lama” irá continuar, considerando a ocupação chinesa no Tibete e ainda fez um comentário detalhado sobre o processo das encarnações do mestres tibetanos e o fenômeno dos “tulkus”.

A tradução do texto em inglês foi feita por Jeanne Pilli e revisada por Marcelo Nicolodi. O original em inglês pode ser encontrado no site oficial de SS o Dalai Lama. A declaração foi publicada no dia 24 de setembro de 2011.

Introdução

Meus companheiros Tibetanos, tanto dentro como fora do Tibete, todos aqueles que seguem a tradição Budista Tibetana, e todos que têm conexão com o Tibete e com os tibetanos: devido à previdência de nossos antigos reis, ministros e eruditos adeptos, o ensinamento completo do Buda, que compreende as escrituras e os ensinamentos vivenciais dos Três Veículos e dos Quatro Conjuntos de Tantra e os assuntos e disciplinas relacionados, floresceu amplamente na Terra das Neves. O Tibete tem servido ao mundo como fonte de tradições budistas e outras tradições culturais relacionadas. Em particular, tem contribuído significativamente para a felicidade de incontáveis seres ​​na Ásia, incluindo a China, Tibete e Mongólia.

Na tarefa de defender a tradição budista no Tibete, nós desenvolvemos uma incomparável tradição tibetana de reconhecer as reencarnações de eruditos adeptos que tem sido de grande ajuda, tanto para os seres sencientes quanto para o Darma e, em particular, para a comunidade monástica.

Desde que o onisciente Gedun Gyatso foi reconhecido e confirmado como a reencarnação de Gedun Drub no século XV e a Gaden Phodrang Labrang (instituição do Dalai Lama) foi criada, sucessivas reencarnações foram reconhecidas. O terceiro na linhagem, Sonam Gyatso, recebeu o título de Dalai Lama. O quinto Dalai Lama, Ngawang Lobsang Gyatso, estabeleceu o Governo Gaden Phodrang em 1642, tornando-se o líder espiritual e político do Tibete. Por mais de 600 anos desde Gedun Drub, uma série de reencarnações inequívocas foi reconhecida na linhagem dos Dalai Lamas.

Os Dalai Lamas têm atuado como líderes políticos e espirituais do Tibete por 369 anos, desde 1642. Eu agora conduzi isto voluntariamente ao fim, orgulhoso e satisfeito para que possamos buscar o tipo de sistema democrático de governo que floresce em outras partes do mundo. Na verdade, já em 1969, deixei claro que as pessoas interessadas deveriam decidir se reencarnações do Dalai Lama deveriam continuar no futuro. No entanto, na ausência de diretrizes claras, se o público interessado expressar um forte desejo de que os Dalai Lamas devem continuar, há um risco evidente de que interesses políticos façam mau uso do sistema de reencarnação para cumprir sua própria agenda política. Portanto, enquanto eu permanecer física e mentalmente apto, me parece importante elaborar orientações claras para reconhecer o próximo Dalai Lama, para que não haja margem para dúvida ou engano. Para que estas diretrizes sejam plenamente compreensíveis, é essencial compreender o sistema de reconhecimento dos tulkus e os conceitos básicos por trás dele. Portanto, vou explicá-lo brevemente a seguir.

Vidas Passadas e Futuras

Para aceitar a reencarnação ou a realidade dos tulkus, precisamos aceitar a existência de vidas passadas e futuras. Os seres sencientes vêm para esta vida presente a partir de vidas passadas e têm novamente um renascimento após a morte. Este tipo de renascimento contínuo é aceito por todas as tradições espirituais e escolas filosóficas indianas antigas, com exceção dos Charvakas, que constituem um movimento materialista. Alguns pensadores modernos negam vidas passadas e futuras com a premissa de que não podemos vê-las. Outros não chegam a conclusões tão claras baseados nessa premissa.

Embora muitas tradições religiosas aceitem o renascimento, diferem em suas visões sobre o quê renasce, como renasce, e como é esta passagem pelo período de transição entre duas vidas. Algumas tradições religiosas aceitam a perspectiva de vida futura, mas rejeitam a idéia de vidas passadas.

Em geral, os budistas acreditam que não existe um início para os nascimentos e que uma vez atingida a liberação da existência cíclica pela superação do carma e das emoções destrutivas, nós não renasceremos sob a influência dessas condições. Portanto, os budistas acreditam que há um fim para o renascimento como resultado do carma e de emoções destrutivas, mas a maioria das escolas filosóficas budistas não aceita que o fluxo mental chegue a um fim. Rejeitar renascimentos passados e futuros seria uma contradição ao conceito budista de base, caminho e resultado, que deve ser explicado com base na mente disciplinada ou indisciplinada. Se aceitarmos este argumento, logicamente estaríamos aceitando que o mundo e seus habitantes surgem sem causas e condições. Portanto, para que você seja budista, é necessário que aceite renascimentos passados e futuros.

Para aqueles que se lembram de suas vidas passadas, o renascimento é uma experiência clara. No entanto, a maioria dos seres comuns se esquece de suas vidas passadas durante o processo da morte, estado intermediário e renascimento. Como renascimentos passados e futuros são obscuros para eles, precisamos usar uma lógica baseada em evidências para comprovar renascimentos passados e futuros.

Há muitos diferentes argumentos lógicos oferecidos pelos discursos do Buda e comentários subsequentes para provar a existência de vidas passadas e futuras. Resumidamente, se reduzem a quatro pontos: a lógica de que as coisas são precedidas por coisas similares, a lógica de que as coisas têm uma causa substancial, a lógica de que a mente obteve familiaridade com coisas no passado, e a lógica de ter obtido experiência com as coisas no passado.

Em última análise, todos esses argumentos se baseiam na idéia de que a natureza da mente, sua clareza e consciência, deve ter luminosidade e consciência como causa substancial. Ela não pode ter nenhuma outra entidade, tal como um objeto inanimado, como sua causa substancial. Isto é evidente por si mesmo. Por análise lógica, inferimos que um novo fluxo de luminosidade e consciência não pode surgir sem causas ou a partir de causas não relacionadas. Ao observar que a mente não pode ser produzida em laboratório, também inferimos que nada pode eliminar a continuidade da luminosidade e consciência sutis.

Que eu saiba, nenhum psicólogo, físico ou neurocientista moderno foi capaz de observar ou predizer a produção da mente a partir da matéria ou sem causa.

Há pessoas que podem lembrar suas vidas imediatamente anteriores ou mesmo várias vidas passadas, bem como são capazes de reconhecer lugares e parentes dessas vidas. Isto não é apenas algo que aconteceu no passado. Hoje em dia há pessoas, no oriente e no ocidente, capazes de recordar incidentes e experiências de suas vidas passadas. Negar isto não é uma forma honesta e imparcial de realizar pesquisas, porque vai contra esta evidência. O sistema tibetano de reconhecer reencarnações é um modo autêntico de investigação baseado nas lembranças de vidas passadas das pessoas.

Como o Renascimento Acontece

Existem duas formas pelas quais uma pessoa pode ter um renascimento após a morte: renascer por influência do carma e de emoções destrutivas e renascer pelo poder da compaixão e das preces. Com respeito à primeira, devido à ignorância, são criados carmas negativos e positivos e suas marcas permanecem na consciência. Estas são reativadas pelo desejo e apego, nos lançando para a próxima vida. Assim temos um renascimento involuntário em reinos inferiores ou superiores. Esta é a forma pela qual seres comuns circulam incessantemente pela existência como o girar de uma roda. Mesmo sob tais circunstâncias, seres comuns podem se engajar diligentemente com uma aspiração positiva em práticas virtuosas em suas vidas cotidianas. Eles se familiarizam com a virtude, que é reativada no momento da morte para que tenham um renascimento em reinos de existência superiores. Por outro lado, bodisatvas superiores, que realizaram o caminho da visão, não renascem por força de seus carmas e emoções destrutivas, mas pelo poder da compaixão pelos seres sencientes e com base em suas preces para benefício de outros. Eles são capazes de escolher o local e o momento de seu renascimento bem como seus futuros pais. Tal renascimento, que ocorre apenas para o benefício de outros, é o renascer pelo poder da compaixão e das preces.

O Significado de Tulku

Diz-se que o costume tibetano de usar o epíteto “Tulku” (Emanação do Corpo do Buda) para reencarnações reconhecidas surgiu quando foi utilizado por devotos como um título honorário, mas desde então tornou-se uma expressão comum. Em geral, o termo Tulku se refere a um aspecto particular do Buda, um dos três ou quatro descritos no Veículo dos Sutras. De acordo com esta explicação desses aspectos do Buda, uma pessoa que é totalmente vinculada às emoções destrutivas e ao carma tem o potencial de atingir o Corpo da Verdade (Dharmakaya), que compreende o Corpo da Verdade da Sabedoria e o Corpo da Verdade da Natureza. O primeiro se refere à mente iluminada de um Buda, que enxerga tudo direta e precisamente, assim como é, instantaneamente. Libertou-se de todas as emoções destrutivas, bem como de suas marcas, pela acumulação de mérito e sabedoria por um longo período de tempo. O último, o Corpo da Verdade da Natureza, refere-se à natureza de vacuidade daquela mente iluminada onisciente. Estes dois reunidos são por si mesmos aspectos dos Budas. No entanto, por não serem diretamente acessíveis aos outros, mas apenas pelos próprios Budas, é imperativo que os Budas se manifestem em formas físicas que sejam acessíveis aos seres sencientes para ajudá-los. Por isso, o aspecto físico final de um Buda é o Corpo de Completo Regozijo (Sambhogakaya), acessível aos bodisatvas superiores, e que tem cinco qualificações definidas, tais como residir no Céu de Akanishta. E a partir do Corpo de Completo Regozijo, manifestam-se miríades de Corpos de Emanações ou Tulkus (Nirmanakaya), de Budas, que surgem como deuses ou humanos e são acessíveis até mesmo para seres comuns. Estes dois aspectos físicos do Buda são chamados Corpos da Forma, voltados para os outros.

O Corpo de Emanação é triplo: a) o Corpo de Emanação Suprema como o Buda Shakyamuni, o Buda histórico, que manifestou as doze ações de um Buda tais como ter nascido em local escolhido por ele e assim por diante; b) o Corpo de Emanação Artística que serve os outros por surgir como artesãos, artistas e assim por diante; e c) Corpo de Emanação Encarnada, de acordo com o qual surgem Budas sob várias formas como seres humanos, deidades, rios, pontes, plantas medicinais, e árvores para auxiliar seres sencientes. Destes três tipos de Corpos de Emanação, as reencarnações de mestres espirituais reconhecidos como “Tulkus” no Tibet estão na terceira categoria. Entre estes Tulkus pode haver muitos que são Corpos de Emanação Encarnados de Budas verdadeiramente qualificados, mas isto não se aplica necessariamente a todos. Entre os Tulkus do Tibet pode haver aqueles que são reencarnações de bodisatvas superiores, bodisatvas que estão nos caminhos de acumulação e preparação, bem como mestres que evidentemente ainda não iniciaram estes caminhos dos bodisatvas. Portanto, o título de Tulku é dado a Lamas reencarnados tanto com base na semelhança com seres iluminados quanto através de sua conexão com certas qualidades de seres iluminados.

Como Jamyang Khyentse Wangpo disse:

“Reencarnação é aquilo que ocorre quando uma pessoa tem um renascimento após a morte de seu predecessor; emanação é quando a manifestação ocorre sem que sua fonte tenha falecido.”

Reconhecimento das Reencarnações

A prática de reconhecer quem é quem pela identificação da vida prévia de uma pessoa ocorreu até mesmo quando o próprio Buda Shakyamuni estava vivo. Muitos relatos se encontram nas quatro Seções Agama do Vinaya Pitaka, nas histórias Jataka, no Sutra do Sábio e do Tolo, no Sutra dos Cem Carmas e assim por diante, nos quais o Tatágata revelou as operações do carma, recontando inúmeras histórias a respeito de como os efeitos de certos carmas criados em vidas passadas são vivenciados por uma pessoa em sua vida presente. Da mesma forma, nas histórias das vidas de mestres indianos, que viveram depois do Buda, muitos revelam seus locais de renascimentos anteriores. Há muitas dessas histórias, mas o sistema de reconhecimento e numeração dessas reencarnações não ocorreu na Índia.

O Sistema de Reconhecimento de Reencarnações no Tibete

Vidas passadas e futuras foram afirmadas pela tradição indígena tibetana Bön antes da chegada do Budismo. E desde que o Budismo se espalhou pelo Tibete, absolutamente todos os tibetanos acreditam em vidas passadas e futuras. As investigações de reencarnações de mestres espirituais que apoiaram o Darma, bem como o costume de rezar devotadamente a eles, floresceram em todos os lugares do Tibete. Muitas escrituras autênticas, livros tibetanos originais como o Mani Kabum e os Ensinamentos Quíntuplos Kathang e outros como Os Livro dos Discípulos Kadam e a Guirlanda de Joias: Respostas a Buscas, que foram recontados pelo glorioso e incomparável mestre indiano Atisha Dipankara no Século XI no Tibet, contam histórias de reencarnações de Arya Avalokiteshvara, o bodisatva da Compaixão. No entanto, a tradição atual de reconhecimento formal de reencarnações de mestres teve início com o reconhecimento do Karmapa Pagshi como reencarnação do Karmapa Dusum Khyenpa por seus discípulos conforme sua previsão. Desde então, existiram dezessete encarnações do Karmapa ao longo de mais de novecentos anos. Da mesma forma, desde o reconhecimento de Kunga Sangmo como reencarnação de Khandro Choekyi Dronme no Século XV existiram mais de dez encarnações de Samding Dorje Phagmo. Então, entre os Tulkus reconhecidos no Tibet há praticantes monásticos e leigos, homens e mulheres. Este sistema de reconhecimento de encarnações se espalhou gradualmente para outras tradições budistas tibetanas, e o Bon, no Tibet. Hoje, há Tulkus reconhecidos em todas as tradições budistas tibetanas, Sakya, Geluk, Kagyu e Nyingma, bem como na Jonang e Bodong, que oferecem o Darma. E também é evidente que entre estes Tulkus alguns são uma vergonha.

O onisciente Gedun Drub, que foi discípulo direto de Je Tsongkhapa, fundou o Monastério Tashi Lhunpo em Tsang e cuidou de seus alunos. Faleceu em 1464 com 84 anos de idade. Embora inicialmente nenhum esforço tenha sido feito para identificar sua reencarnação, as pessoas foram obrigadas a reconhecer uma criança chamada Sangye Chophel, nascida em Tanak, Tsang (1476), devido às surpreendentes e perfeitas recordações de sua vida passada. Desde então, iniciou-se a tradição de buscar e reconhecer as reencarnações sucessivas dos Dalai Lamas pelo Gaden Phodrang Labrang e mais tarde pelo Governo Gaden Phodrang.

As Formas de Reconhecer Reencarnações

Depois que este sistema de reconhecimento de Tulkus passou a existir, vários procedimentos começaram a ser desenvolvidos. Entre estes, alguns dos mais importantes incluem uma carta preditiva do predecessor e outras instruções e indicações que podem ocorrer; observar a reencarnação contando e falando de forma confiável sobre sua vida anterior; identificação de pertences do predecessor e reconhecimento de pessoas que eram próximas a ele. Alem destes, outros métodos incluem solicitar adivinhações de mestres espirituais confiáveis bem como buscar previsões de oráculos mundanos, que se manifestam por meio de médiuns em transe, e observar as visões que se manifestam em lagos sagrados de protetores como Lhamoi Latso, um lago sagrado ao sul de Lhasa.

Quando existe mais de um candidato em potencial a ser reconhecido como um Tulku, e torna-se difícil decidir, há uma prática para a tomada de decisão final por adivinhação que emprega o método da bola de massa de pão (zen tak) diante de uma imagem sagrada enquanto se evoca o poder da verdade.

Emanação Antes do Falecimento do Predecessor (ma-dhey tulku)

Geralmente uma reencarnação deve ser alguém que renasce como um ser humano após seu prévio falecimento. Seres humanos comuns geralmente não são capazes de se manifestar como emanação antes de sua morte (ma-dhey tulku), mas bodisatvas superiores, que podem se manifestar em centenas ou milhares de corpos simultaneamente, podem manifestar-se como emanações antes da morte. No sistema tibetano de reconhecimento de Tulkus há emanações que pertencem ao mesmo fluxo mental do predecessor, emanações conectadas a outras pelo poder do carma e preces, e emanações que surgem como resultado de bênçãos e nomeação.

O propósito principal do surgimento de uma reencarnação é a continuidade do trabalho incompleto do predecessor para servir ao Darma e aos seres. No caso de um Lama que é um ser comum, ao invés de ter uma reencarnação pertencente ao mesmo fluxo mental, uma outra pessoa conectada a este Lama por meio de carma puro e preces pode ser reconhecida como sua emanação. Como alternativa é possível ao Lama apontar um sucessor que seja seu discípulo ou alguém mais jovem para que seja reconhecido como sua emanação. Já que estas opções são possíveis para o caso de um ser comum, é possível uma emanação antes da morte que não pertença ao mesmo fluxo mental. Em alguns casos, um Lama realizado pode ter várias reencarnações simultaneamente, tais como encarnações de corpo, fala e mente e assim por diante. Recentemente, tivemos emanações antes da morte bem conhecidas como Dudjom Jigdral Yeshe Dorje e Chogye Trichen Ngawang Khyenrab.

O Uso da Urna Dourada

À medida que esta era de degeneração avança, e como cada vez mais reencarnações de lamas realizados estão sendo reconhecidas, algumas delas por motivos políticos, um número crescente tem sido reconhecido por meios inapropriados e questionáveis, e como resultado, tem sido causado um enorme prejuízo ao Darma.

Durante o conflito entre o Tibete e os Gurkhas (1791-93) o Governo Tibetano teve que recorrer à ajuda militar da Manchúria. Consequentemente, os militares Gurkha foram expulsos do Tibet, mas mais tarde os oficiais da Manchúria fizeram uma proposta de 29 pontos sob o pretexto de tornar a administração do Governo Tibetano mais eficiente. Esta proposta incluiu a sugestão de sorteio de nomes dos candidatos colocados em uma Urna Dourada para decidir o reconhecimento das reencarnações dos Dalai Lamas, Panchen Lamas e Hutuktus, um título mongol dado a Lamas importantes. Assim, este procedimento foi seguido em casos de reconhecimento das reencarnações dos Dalai Lamas, Panchen Lamas e outros Lamas importantes. O ritual a ser seguido foi escrito pelo Oitavo Dalai Lama Jampel Gyatso. Mesmo depois de tal sistema ter sido introduzido, o procedimento foi dispensado nos casos do Nono, do Décimo-Terceiro e no meu próprio caso, o Décimo-Quarto Dalai Lama.

Mesmo no caso do Décimo Dalai Lama, a reencarnação autêntica já tinha sido encontrada, e na realidade este procedimento não foi seguido; mas para agradar os oficiais da Manchúria foi meramente anunciado que o procedimento havia sido observado.

O sistema da Urna Dourada foi realmente usado apenas nos casos do Décimo-Primeiro e do Décimo-Segundo Dalai Lamas. No entanto, o Décimo-Segundo Dalai Lama já havia sido reconhecido antes do procedimento ter sido empregado. Sendo assim, houve apenas uma ocasião em que o Dalai Lama foi reconhecido por esse método. Da mesma forma, entre as reencarnações do Panchen Lama, com exceção do Oitavo e do Nono, este método não foi empregado em nenhum outro caso. Este sistema foi imposto pelos manchurianos, mas os tibetanos não acreditavam nele por ser desprovido de qualquer qualidade espiritual. No entanto, se fosse utilizado de forma honesta, poderíamos considerá-lo um método similar à adivinhação pelas bolas de massa de pão (zen tak).

Em 1880, durante o reconhecimento de Décimo-Terceiro Dalai Lama como a reencarnação do Décimo-Segundo, ainda existiam traços da relação religiosa-temporal entre o Tibet e a Manchúria. Ele foi reconhecido como a reencarnação inequívoca do oitavo Panchen Lama, pelas previsões dos oráculos de Nechung e Samye e pelas visões em Lhamoi Latso, e por isso o procedimento da Urna Dourada não foi seguido. Isto pode ser claramente compreendido por meio do testamento final do Décimo-Terceiro Dalai Lama do Ano do Macaco de Água (1933) no qual ele declara:

“Como vocês sabem, eu não fui escolhido pela forma costumeira de sorteio da Urna Dourada, mas minha escolha foi anunciada e adivinhada. De acordo com essas adivinhações e profecias eu fui reconhecido como a reencarnação do Dalai Lama e entronado.”

Quando eu fui reconhecido como a Décima-Quarta encarnação do Dalai Lama em 1939 a relação religiosa-temporal entre o Tibet e a China já havia chegado ao fim. Portanto, não havia dúvidas sobre qualquer necessidade de confirmar a reencarnação pelo uso da Urna Dourada. Sabe-se bem que o Regente do Tibet e a Assembleia Nacional Tibetana seguiram o procedimento de reconhecimento da reencarnação do Dalai Lama levando em conta as profecias de Lamas realizados, oráculos e de visões no Lhanoi Latso; os Chineses não tiveram absolutamente nenhum envolvimento. No entanto, mais tarde alguns oficiais do Guomintang (Partido Nacionalista Chinês) ardilosamente espalharam mentiras nos jornais alegando que eles haviam concordado em renunciar ao uso da Urna Dourada e que Wu Chung-tsin havia presidido minha entronização, e assim por diante. Esta mentira foi exposta por Ngabo Ngawang Jigme, o Vice-Presidente da Comissão Permanente do Congresso Popular Nacional, a quem a República Popular da China considerou a pessoa mais progressista, na Segunda Sessão do Quinto Congresso Popular da Região Autônoma do Tibet (31 de Julho de 1989). Isto fica claro quando, no final de seu discurso, no qual deu explicações detalhadas dos eventos e apresentou evidências documentadas, ele insistiu:

“Que necessidade há de o Partido Comunista seguir o exemplo e dar continuidade às mentiras do Guomintang?”

Estratégia Enganosa e Falsas Esperanças

No passado recente, existiram casos de gestores irresponsáveis dos espólios de lamas abastados que se entregaram a métodos impróprios para reconhecer reencarnações, os quais têm prejudicado o Darma, a comunidade monástica e nossa sociedade. Além do mais, desde a era manchuriana, autoridades políticas chinesas repetidamente se engajaram em vários meios traiçoeiros utilizando o budismo, mestres budistas e Tulkus como instrumentos para atingir seus objetivos políticos, envolvendo-se em questões mongóis e tibetanas. Atualmente, os governantes autoritários da República Popular da China, que como comunistas rejeitam a religião, mas ainda se envolvem em questões religiosas, impuseram a chamada campanha de reeducação e declararam a chamada Ordem nº Cinco, com respeito ao controle e reconhecimento de reencarnações, que passou a vigorar em 1º de Setembro de 2007. Isto é ultrajante e vergonhoso. A aplicação de vários métodos inapropriados de reconhecimento de reencarnações para erradicar nossas incomparáveis tradições culturais tibetanas está causando danos difíceis de serem reparados.

Além do mais, eles dizem que estão aguardando a minha morte e que reconhecerão o Décimo-Quinto Dalai Lama de sua escolha. É claro que, a partir de suas recentes regras e regulamentos e subsequentes declarações , eles têm uma estratégia detalhada para enganar os tibetanos, seguidores da tradição budista tibetana, e a comunidade mundial. Portanto, como eu tenho a responsabilidade de proteger o Darma e os seres sencientes contra tais regimes prejudiciais, eu faço a seguinte declaração.

A Próxima Encarnação do Dalai Lama

Como mencionei anteriormente, a reencarnação é um fenômeno que pode ocorrer por meio de escolha voluntária da pessoa em questão ou ao menos pela força de seu carma, mérito e preces. Portanto, a pessoa que reencarna tem autoridade legitimada exclusiva sobre onde e como ele ou ela terá renascimento e como a reencarnação será reconhecida. É uma realidade que ninguém mais pode forçar a pessoa em questão, ou manipulá-la. É particularmente inapropriado para os comunistas chineses, que explicitamente rejeitam até mesmo a idéia de vidas passadas e futuras, quanto mais o conceito de Tulkus reencarnados, interferirem no sistema de reencarnação e especialmente de reencarnações dos Dalai Lamas e Panchen Lamas. Tal intromissão descarada contradiz suas próprias ideologias políticas e revela sua duplicidade de parâmetros. Se esta situação continuar no futuro, será impossível para os tibetanos e para aqueles que seguem a tradição budista tibetana reconhecê-la ou aceitá-la.

Quando eu tiver cerca de noventa anos, eu consultarei os lamas realizados das tradições budistas tibetanas, o público tibetano e outras pessoas pertinentes que seguem o budismo tibetano, e reavaliarei se a instituição do Dalai Lama deve continuar ou não. Sobre esta base tomaremos uma decisão. Se for decidido que a reencarnação do Dalai Lama deve continuar e que há a necessidade de que o Décimo-Quinto Dalai Lama seja reconhecido, a responsabilidade por fazê-lo será principalmente dos Oficiais do Gaden Phodrang do Dalai Lama. Eles deverão consultar os vários chefes das tradições budistas tibetanas e os protetores do Darma comprometidos e confiáveis que estão inseparavelmente ligados à linhagem dos Dalai Lamas. Eles deverão buscar aconselhamento e instruções destes seres e conduzir os procedimentos de procura e reconhecimento de acordo com a tradição do passado. Eu deixarei instruções escritas claras sobre isso. Tenham em mente que, com exceção de reencarnações reconhecidas por meio de tais métodos legítimos, nenhum reconhecimento ou aceitação deverão ser concedidos a um candidato escolhido para fins políticos de ninguém, incluindo aqueles da República Popular da China.

O Dalai Lama

Dharamsala